Contrato de encomenda: cláusulas-chave para ateliês

Por Parceria Jurídica

31 de outubro de 2025

Ateliês de costura e moda sob medida lidam com relações contratuais que envolvem tanto aspectos técnicos quanto jurídicos. O contrato de encomenda é o instrumento que formaliza obrigações e direitos entre o cliente e o prestador de serviço. Ele abrange desde prazos e políticas de ajustes até a propriedade intelectual dos moldes desenvolvidos. Uma estrutura contratual clara reduz riscos, previne conflitos e confere segurança jurídica à atividade artesanal.

No cenário atual, o crescimento de serviços personalizados e sob demanda torna indispensável definir termos objetivos sobre entrega, devoluções, alterações e cancelamentos. A informalidade, comum nesse segmento, pode gerar prejuízos quando não há previsão contratual adequada. Assim, formalizar o acordo é medida estratégica e protetiva.

Além de aspectos operacionais, o contrato deve observar princípios de boa-fé, transparência e adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), especialmente quando envolve coleta de medidas corporais e registros de imagem.

 

Descrição do serviço e obrigações do prestador

O primeiro elemento essencial é a descrição detalhada do serviço. O contrato deve especificar o tipo de peça, materiais fornecidos, etapas de execução e prazos estimados. Em casos de urgência, quando o cliente solicita atendimento rápido — como consertar roupa na hora —, é recomendável incluir cláusula sobre atendimento prioritário e possível acréscimo no valor. Essa previsão evita mal-entendidos e legitima ajustes de preço.

Também é importante explicitar as obrigações do prestador quanto à qualidade e conformidade do serviço. A entrega deve respeitar o padrão acordado, com eventuais defeitos ou inconformidades corrigidos sem custo adicional quando comprovada falha técnica.

O detalhamento prévio das condições de execução protege ambas as partes e serve de parâmetro para futuras análises de responsabilidade.

 

Propriedade de moldes e desenhos técnicos

A autoria de moldes, croquis e modelagens originais deve ser definida expressamente. Em regra, o molde desenvolvido pelo ateliê pertence ao criador, salvo cessão formal. Quando o cliente solicita exclusividade, o contrato precisa prever compensação financeira proporcional ao direito transferido.

Essa cláusula é fundamental para evitar litígios relacionados ao uso indevido de moldes em coleções subsequentes. O documento deve distinguir entre “uso comercial” e “uso pessoal”, estabelecendo se o cliente poderá reproduzir a peça em larga escala.

A ausência dessa previsão pode resultar em disputa sobre propriedade intelectual e impedir o ateliê de reutilizar modelos desenvolvidos internamente.

 

Prazos, ajustes e política de alterações

Os prazos de entrega e as condições para ajustes posteriores devem constar de forma objetiva. Recomenda-se estabelecer limites de número de provas, prazo máximo para solicitações de modificação e política de cobrança para alterações não previstas no pedido original.

Uma boa prática é vincular o cronograma de execução à aprovação de etapas intermediárias, como escolha de tecido e prova inicial. O contrato também deve prever margem de tolerância para imprevistos técnicos, desde que comunicados com antecedência.

Essas disposições conferem previsibilidade operacional e reduzem disputas decorrentes de expectativas divergentes entre cliente e costureiro.

 

Uso de imagem e consentimento do cliente

Ateliês frequentemente utilizam registros fotográficos de peças produzidas para divulgação em redes sociais e catálogos. O uso de imagem do cliente, entretanto, depende de consentimento expresso, nos termos do artigo 7º da Lei nº 13.709/2018 (LGPD) e do artigo 20 do Código Civil.

O contrato deve conter cláusula autorizando ou restringindo a divulgação de fotos do cliente com a peça pronta, assegurando direito à revogação a qualquer tempo. A ausência de autorização pode gerar responsabilização civil por uso indevido de imagem.

Essa precaução demonstra profissionalismo e reforça a confiança do consumidor, além de evitar violações à privacidade.

 

Tratamento de dados pessoais e medidas corporais

A coleta de medidas, fotos e outras informações sensíveis enquadra-se no conceito de dado pessoal sensível, conforme a LGPD. O ateliê é responsável por adotar medidas de segurança e limitar o uso dos dados ao propósito declarado — confecção da peça.

O contrato deve especificar a finalidade da coleta, o período de armazenamento e os procedimentos de eliminação após a conclusão do serviço. Também deve indicar quem tem acesso às informações e como o cliente pode exercer seus direitos de exclusão ou retificação.

Esse cuidado reforça a conformidade legal e previne sanções administrativas por tratamento inadequado de dados pessoais.

 

Rescisão contratual e solução de conflitos

Por se tratar de serviço sob medida, o contrato deve prever regras específicas de cancelamento. Recomenda-se cláusula de multa proporcional ao estágio da produção, a fim de compensar materiais adquiridos e tempo investido. Cancelamentos antes do início da execução podem prever devolução parcial de valores pagos.

Para conflitos, é indicada a inclusão de cláusula compromissória ou mediação prévia antes de eventual ação judicial. Essa prática agiliza a resolução e preserva o relacionamento entre as partes.

Ao estruturar contratos com clareza e rigor técnico, o ateliê transforma a formalização jurídica em instrumento de gestão, profissionalização e segurança operacional.

 

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